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Do canto agressivo ao combate, comportamento territorial ajuda a mapear diversidade de pererecas
Durante um mesmo dia, um único animal pode percorrer uma grande área em busca de recursos e de parceiros. Para delimitar esses territórios, algumas espécies emitem sons ou mesmo partem para o ataque aos concorrentes. Essa defesa da área onde há recursos que precisam ser defendidos se chama comportamento territorial.
De olho nesse aspecto, o pesquisador Ricardo Luría-Manzano, que estuda anfíbios em seu doutorado no Instituto de Biociências (IB) da USP, compilou os dados na literatura científica a respeito dos fatores que levam as pererecas da subfamília Hylinae a defenderem seus territórios e descobriu que as espécies de água parada tendem a ser mais territorialistas.
Esse ramo da família das pererecas é o que comporta o maior número dos anfíbios conhecidos no mundo. As mais de 700 espécies são separadas em tribos, das quais foram estudadas cinco: Cophomantini, Dendropsophini, Hylini, Lophyohylini e Sphaenorhynchini.
Grande parte desses bichos aparece em território latino-americano, mas encontrá-los não é tão simples. Diferentemente dos sapos e das rãs, as pererecas costumam viver escondidas sobre árvores e plantas, de onde saem, principalmente, para a reprodução.
Os detalhes evolutivos desse grupo de animais que levam à defesa territorial ainda não eram totalmente compreendidos. Por isso, Ricardo criou uma base de dados com centenas de espécies e suas características, tendo a territorialidade como foco.
Há uma grande variação de características territoriais dentro de um mesmo grupo de pererecas. Mesmo assim, o biólogo, que contou com a parceria de outros pesquisadores da USP e da Unesp, identificou um padrão: espécies que se reproduzem em águas paradas, e não em riachos, tendem a apresentar mais traços de defesa territorial. Isso pode ser explicado pelo fato de que as densidades populacionais são maiores em lagos e poças d’água.
Além do canto agressivo e do combate físico, existem características anatômicas que podem estar associadas à territorialidade, como a diferença de tamanho entre os machos e as fêmeas (dimorfismo sexual).
Normalmente, as fêmeas de anfíbios são maiores. Quando o macho tinha o mesmo tamanho, pensava-se que fosse devido à necessidade de proteger um território. No entanto, Ricardo encontrou muitas exceções.
“Os atributos comportamentais são mais maleáveis ao longo da história evolutiva do grupo e podem ser perdidos mais facilmente.” Isso pode explicar por que algumas características físicas não necessariamente desembocam em um comportamento mais ou menos agressivo.
“Nós testamos se o canto territorial e o combate físico estavam associados ao grau de dimorfismo sexual e ao tamanho das espécies, mas não encontramos relação entre esses atributos”, constata o biólogo. (Ivan Conterno/ Jornal da USP)