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Doenças diarreicas agudas
As doenças diarreicas agudas (DDA) correspondem a um grupo de doenças infecciosas gastrointestinais. São caracterizadas por uma síndrome em que há ocorrência de no mínimo três episódios de diarreia aguda em 24 horas, ou seja, diminuição da consistência das fezes e aumento do número de evacuações, quadro que pode ser acompanhado de náusea, vômito, febre e dor abdominal. Em geral, são doenças autolimitadas com duração de até 14 dias. Em alguns casos, há presença de muco e sangue, quadro conhecido como disenteria. A depender do agente causador da doença e de características individuais dos pacientes, as DDA podem evoluir clinicamente para quadros de desidratação que variam de leve a grave.
A diarreia pode ser de origem não infecciosa podendo ser causada por medicamentos, como antibióticos, laxantes e quimioterápicos utilizados para tratamento de câncer, ingestão de grandes quantidades de adoçantes, gorduras não absorvidas, e até uso de bebidas alcoólicas, por exemplo. Além disso, algumas doenças não infecciosas também podem desencadear diarreia, como a doença de Chron, as colites ulcerosas, a doença celíaca, a síndrome do intestino irritável e intolerâncias alimentares como à lactose e ao glúten.
Causas
As doenças diarreicas agudas (DDA) podem ser causadas por diferentes microrganismos infecciosos (bactérias, vírus e outros parasitas, como os protozoários) que geram a gastroenterite – inflamação do trato gastrointestinal – que afeta o estômago e o intestino. A infecção é causada por consumo de água e alimentos contaminados, contato com objetos contaminados e também pode ocorrer pelo contato com outras pessoas, por meio de mãos contaminadas, e contato de pessoas com animais.
Quais são os fatores de risco para doenças diarreicas agudas?
Qualquer pessoa, de qualquer faixa etária e gênero, pode manifestar sinais e sintomas das doenças diarreicas agudas após a contaminação. No entanto, alguns comportamentos podem colocar as pessoas em risco e facilitar a contaminação como:
— Ingestão de água sem tratamento adequado;
— Consumo de alimentos sem conhecimento da procedência, do preparo e armazenamento;
— Consumo de leite in natura (sem ferver ou pasteurizar) e derivados;
— Consumo de produtos cárneos e pescados e mariscos crus ou malcozidos;
— Consumo de frutas e hortaliças sem higienização adequada;
— Viagem a locais em que as condições de saneamento e de higiene sejam precárias;
— Falta de higiene pessoal.
Atenção: Crianças e idosos com DDA correm risco de desidratação grave. Nestes casos, a procura ao serviço de saúde deve ser realizada em caráter de urgência.
Sinais e sintomas
Ocorrência de no mínimo três episódios de diarreia aguda no período de 24hrs (diminuição da consistência das fezes – fezes líquidas ou amolecidas – e aumento do número de evacuações) podendo ser acompanhados de:
— Cólicas abdominais;
— Dor abdominal;
— Febre;
— Sangue ou muco nas fezes;
— Náusea;
— Vômitos.
Complicações
A principal complicação é a desidratação, que se não for corrigida rápida e adequadamente, em grande parte dos casos, especialmente em crianças e idosos, pode causar complicações mais graves. O paciente com diarreia deve estar atento e voltar imediatamente ao serviço de saúde se não melhorar ou se apresentar qualquer um dos sinais e sintomas:
— Piora da diarreia;
— Vômitos repetidos;
— Muita sede;
— Recusa de alimentos;
— Sangue nas fezes;
— Diminuição da urina.
Diagnóstico
O diagnóstico das causas etiológicas, ou seja, dos microrganismos causadores da DDA é realizado apenas por exame laboratorial por meio de exames parasitológicos de fezes, cultura de bactérias (coprocultura) e pesquisa de vírus. O diagnóstico laboratorial é importante para determinar o perfil de agentes etiológicos circulantes em determinado local e, na vigência de surtos, para orientar as medidas de controle. Em casos de surto, solicitar orientação da equipe de vigilância epidemiológica do município para coleta de amostras.
Importante: As fezes devem ser coletadas antes da administração de antibióticos e outros medicamentos ao paciente. Recomenda-se a coleta de 2 a 3 amostras de fezes por paciente.
O diagnóstico etiológico das Doenças Diarreicas Agudas nem sempre é possível, uma vez que há uma grande dificuldade para a realização das coletas de fezes, o que se deve, entre outras questões, à baixa solicitação de coleta de amostras pelos profissionais de saúde e à reduzida aceitação e coleta pelos pacientes. Desse modo, é importante que o indivíduo doente seja bem esclarecido quanto à relevância da coleta de fezes, especialmente na ocorrência de surtos, casos com desidratação grave, casos que apresentam fezes com sangue e casos suspeitos de cólera a fim de possibilitar a identificação do microrganismo que causou diarreia. Essa informação será útil para prevenir a transmissão da doença para outras pessoas. A coleta de fezes para análise laboratorial é de grande importância para a identificação de agentes circulantes e, especialmente em caso de surtos, para se identificar o agente causador do surto, bem como a fonte da contaminação.
Prevenção
As intervenções para prevenir a diarreia incluem ações institucionais de saneamento e de saúde, além de ações individuais que devem ser adotadas pela população:
— Lave sempre as mãos com sabão e água limpa principalmente antes de preparar ou ingerir alimentos, após ir ao banheiro, após utilizar transporte público ou tocar superfícies que possam estar sujas, após tocar em animais, sempre que voltar da rua, antes e depois de amamentar e trocar fraldas;
— Lave e desinfete as superfícies, os utensílios e equipamentos usados na preparação de alimentos;
— Proteja os alimentos e as áreas da cozinha contra insetos, animais de estimação e outros animais (guarde os alimentos em recipientes fechados);
— Trate a água para consumo (após filtrar, ferver ou colocar duas gotas de solução de hipoclorito de sódio a 2,5% para cada litro de água, aguardar por 30 minutos antes de usar);
— Guarde a água tratada em vasilhas limpas e com tampa, sendo a “boca” estreita para evitar a recontaminação;
— Não utilize água de riachos, rios, cacimbas ou poços contaminados para banhar ou beber;
— Evite o consumo de alimentos crus ou malcozidos (principalmente carnes, pescados e mariscos) e alimentos cujas condições higiênicas, de preparo e acondicionamento, sejam precárias;
— Ensaque e mantenha a tampa do lixo sempre fechada; quando não houver coleta de lixo, este deve ser enterrado em local apropriado;
— Use sempre o vaso sanitário, mas se isso não for possível, enterre as fezes sempre longe dos cursos de água;
— Evite o desmame precoce. Manter o aleitamento materno aumenta a resistência das crianças contra as diarreias.
Tratamento
O tratamento das doenças diarreicas agudas se fundamenta na prevenção e na rápida correção da desidratação por meio da ingestão de líquidos e solução de sais de reidratação oral (SRO) ou fluidos endovenosos, dependendo do estado de hidratação e da gravidade do caso. Por isso, apenas após a avaliação clínica do paciente, o tratamento adequado deve ser estabelecido, conforme os planos A, B e C descritos abaixo. Para indicar o tratamento é imprescindível a avaliação clínica do paciente e do seu estado de hidratação.
A abordagem clínica constitui a coleta de dados importantes na anamnese, como: início dos sinais e sintomas, número de evacuações, presença de muco ou sangue nas fezes, febre, náuseas e vômitos; presença de doenças crônicas; verificação se há parentes ou conhecidos que também adoeceram com os mesmos sinais/sintomas.
O exame físico, com enfoque na avaliação do estado de hidratação, é importante para avaliar a presença de desidratação e a instituição do tratamento adequado, além disso, o paciente deve ser pesado, sempre que possível. Se não houver dificuldade de deglutição e o paciente estiver consciente, a alimentação habitual deve ser mantida e deve-se aumentar a ingestão de líquidos, especialmente de água.
Observação: O Tratamento com antibiótico deve ser reservado apenas para os casos de DDA com sangue ou muco nas fezes (disenteria) e comprometimento do estado geral ou em caso de cólera com desidratação grave, sempre com acompanhamento médico.
Plano A
Consiste em cinco etapas direcionadas ao paciente hidratado para realizar no domicílio:
— Aumento da ingestão de água e outros líquidos incluindo solução de SRO principalmente após cada episódio de diarreia, pois dessa forma evita-se a desidratação;
— Manutenção da alimentação habitual; continuidade do aleitamento materno;
— Retorno do paciente ao serviço, caso não melhore em 2 dias ou apresente piora da diarreia, vômitos repetidos, muita sede, recusa de alimentos, sangue nas fezes ou diminuição da diurese;
— Orientação do paciente/responsável/acompanhante para reconhecer os sinais de desidratação; preparar adequadamente e administrar a solução de SRO e praticar ações de higiene pessoal e domiciliar (lavagem adequada das mãos, tratamento da água e higienização dos alimentos);
— Administração de Zinco uma vez ao dia, durante 10 a 14 dias.
Plano B
Consiste em três etapas direcionadas ao paciente com desidratação, porém sem gravidade, com capacidade de ingerir líquidos, que deve ser tratado com SRO na Unidade de Saúde, onde deve permanecer até a reidratação completa.
— Ingestão de solução de SRO, inicialmente em pequenos volumes e aumento da oferta e da frequência aos poucos. A quantidade a ser ingerida dependerá da sede do paciente, mas deve ser administrada continuamente até que desapareçam os sinais da desidratação;
— Reavaliação do paciente constantemente, pois o Plano B termina quando desaparecem os sinais de desidratação, a partir de quando se deve adotar ou retornar ao Plano A;
— Orientação do paciente/responsável/acompanhante para reconhecer os sinais de desidratação; preparar adequadamente e administrar a solução de SRO e praticar ações de higiene pessoal e domiciliar (lavagem adequada das mãos, tratamento da água e higienização dos alimentos).
Plano C
Consiste em duas fases de reidratação endovenosa destinada ao paciente com desidratação grave. Nessa situação o paciente deverá ser transferido o mais rapidamente possível. Os primeiros cuidados na unidade de saúde são importantíssimos e já devem ser efetuados à medida que o paciente seja encaminhado ao serviço hospitalar de saúde.
— Realizar reidratação endovenosa no serviço saúde (fases rápida e de manutenção);
— O paciente deve ser reavaliado após duas horas, se persistirem os sinais de choque, repetir a prescrição; caso contrário, iniciar balanço hídrico com as mesmas soluções preconizadas;
— Administrar por via oral a solução de SRO em doses pequenas e frequentes, tão logo o paciente aceite. Isso acelera a sua recuperação e reduz drasticamente o risco de complicações;
— Suspender a hidratação endovenosa quando o paciente estiver hidratado, com boa tolerância à solução de SRO e sem vômitos.
Transmissão
A transmissão das doenças diarreicas agudas pode ocorrer pelas vias oral ou fecal-oral.
• Transmissão indireta - Pelo consumo de água e alimentos contaminados e contato com objetos contaminados, como por exemplo, utensílios de cozinha, acessórios de banheiros, equipamentos hospitalares;
• Transmissão direta - Pelo contato com outras pessoas, por meio de mãos contaminadas e contato de pessoas com animais.
Os manipuladores de alimentos e os insetos podem contaminar, principalmente, os alimentos, utensílios e objetos capazes de absorver, reter e transportar organismos contagiantes e infecciosos. Locais de uso coletivo, como escolas, creches, hospitais e penitenciárias apresentam maior risco de transmissão das doenças diarreicas agudas.
O período de incubação, ou seja, tempo para que os sintomas comecem a aparecer a partir do momento da contaminação/infecção, e o período de transmissibilidade das DDA são específicos para cada agente etiológico.
Viajantes
Entre os viajantes a DDA é a doença mais previsível, sendo conhecida como “diarreia dos viajantes”. As infecções causadas por bactérias representam de 80 a 90% e as virais de 5 a 8%. Embora os cuidados individuais de prevenção como “lavar as mãos, ferver a água e cozinhar bem os alimentos” sejam práticas que reduzem as infecções e consequentemente a DDA, estudos revelam que as pessoas que seguem essas regras ainda podem ficar doentes, pois a falta de práticas de higiene nos restaurantes locais é provavelmente o maior contribuinte para o risco da “diarreia do viajante”.
Portanto, várias abordagens podem ser recomendadas para reduzir, mas nunca eliminar completamente o risco. As recomendações incluem instruções relativas à seleção de alimentos/bebidas e lavagem cuidadosa das mãos com sabonete.
Quando a lavagem das mãos não for possível, a aquisição de pequenos recipientes de desinfetantes à base de álcool a 70% pode facilitar a limpeza das mãos antes de comer, após o uso do banheiro, antes e após trocar fraldas, após utilização de transporte público, etc. (Ministério da Saúde Brasil)