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    Mais de 200 plantas invasoras ameaçam vegetação nativa do país

    Jaqueiras, amendoeiras-da-praia, casuarinas, jiboias, agaves. São plantas que fazem parte das paisagens brasileiras, mas nem sempre foi assim. Essas espécies não são nativas do Brasil e, trazidas de outros pontos do globo pelo homem, acabaram se espalhando sem controle pelo país.



    Terminalia catappa. Foto: Judgefloro/Wikimedia Commons


    O Banco de Dados Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, mantido pela organização não governamental Instituto Hórus, elenca pelo menos 210 espécies vegetais não nativas que se espalharam por ecossistemas brasileiros, causando danos à flora local.

    As amendoeiras-da-praia ou castanholas (Terminalia catappa), por exemplo, são presença constante nas praias e orlas de lagoas brasileiras. Proveniente da Ásia, provavelmente chegou por aqui de forma não intencional, através da água de lastro de embarcações portuguesas.

    Sendo tolerante a ventos fortes, salinidade e uma variedade de tipos de solos, aqui encontrou terreno fértil para sua expansão, já que suas sementes podem ser carregadas por longas distâncias através das correntes marítimas e são dispersadas pela fauna nativa. Ela até foi plantada intencionalmente em praças e orlas devido à sombra proporcionada por sua copa.

    Sua sombra, no entanto, é justamente o que mais prejudica as espécies vegetais nativas, já que impede a passagem de luz solar e atrapalha o desenvolvimento das mudas. No ambiente praiano, por exemplo, muitas plantas só se desenvolvem a sol pleno.

    Levantamento concluído em 2021 pela bióloga Gyrliane Santos dos Santos, na época graduanda da Universidade Federal do Ceará (UFC), mostrou que a amendoeira-da-praia havia se espalhado por pelo menos 34 unidades de conservação, em nove estados brasileiros, entre elas o Parque Nacional de Fernando de Noronha.

    Assim como a amendoeira-da-praia, as casuarinas (Casuarina equisetifolia) também são um problema para as vegetações costeiras. Originária da Austrália chegou, provavelmente, de forma intencional, sendo usada para fins ornamentais, cercas-vivas e estabilização de dunas.

    Estudo feito por uma equipe da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), em 2020, na restinga do Cabo de Santa Marta, mostrou que a casuarina causa impacto na abundância de indivíduos nativos, reduzindo a cobertura vegetal nas áreas onde estão presentes.

    “Quando são introduzidas em um ambiente diferente daqueles em que elas ocorrem naturalmente, elas [as espécies exóticas] podem se adaptar. Quando elas se adaptam, elas se reproduzem e modificam totalmente o processo ecológico natural daquele ambiente. E quando elas se reproduzem com certo sucesso, elas se tornam dominantes”, explica o pesquisador do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e do projeto Ilhas do Rio Massimo Bovini.

    O pesquisador coordenou um projeto de erradicação do capim-colonião (Megathyrsus maximus) nas Cagarras, ilhas costeiras que são parte da paisagem da orla carioca e abrigam 190 espécies vegetais. Não se sabe se a espécie africana chegou aqui de forma acidental ou intencional, mas hoje é uma das plantas invasoras mais comuns no Brasil.

    “Eu fiz o levantamento de todas as espécies de flora que ocorrem lá na ilha. Mas, ao longo dos dois anos em que fui fazendo o levantamento, uma coisa me incomodava, que era o capim-colonião, uma espécie invasora muito agressiva”, conta o pesquisador.

    O incômodo transformou-se em ação e Bovini iniciou, em 2014, o trabalho de erradicação do capim. Foram alguns anos para se descobrir a melhor forma de lidar com a espécie. “É um trabalho muito árduo, muito difícil, porque o capim cresce muito rápido. Em um mês, ele é capaz de crescer dez centímetros. E quando chove e faz sol, ele cresce mais rápido ainda. Ele se alastra muito rápido”, disse.

    Depois de algumas tentativas, que incluíram fogo controlado, cobertura do capim com lona preta, extração manual e uso de herbicidas, sua equipe concluiu que o melhor resultado foi obtido com a “nucleação”.

    O método inclui o replantio de mudas nativas próximas umas das outras, criando núcleos de vegetação que, ao gerar sombra, evitam naturalmente o crescimento do capim, espécie que necessita de sol pleno para se desenvolver. Mas, mesmo depois de oito anos, o trabalho ainda está no início. E, sem patrocinadores, o projeto realizado no arquipélago, que é uma unidade de conservação federal (Monumento Natural das Ilhas Cagarras), está parado desde julho do ano passado.

    Bovini destaca que, em muitos casos, a supressão de flora nativa, seja por incêndio ou desmatamento, favorece a expansão de plantas invasoras. “Abriu uma clareira, tirou o sombreamento, vem aquele sol direto no solo, com certeza as espécies invasoras vão chegar e chegam muito rápido”.

    O Parque Nacional da Tijuca, também na cidade do Rio, é outra unidade de conservação federal que tem que lidar com espécies invasoras, como o capim-colonião, a jaqueira (Artocarpus heterophyllus), originária da Índia, e a dracena (Dracaena fragrans).

    O capim-colonião é uma preocupação extra para o parque porque é suscetível ao fogo e pode servir como estopins para incêndios que atinjam a mata. Um levantamento feito entre 2014 e 2015 mostrou que a gramínea ocupava 2% da área total do parque, ou 83 mil metros quadrados. No setor Covanca, o capim ocupava quase 13% da área.

    Assim como acontece com os animais, nem todas as plantas invasoras vêm de outros países. O banco de dados do Instituto Hórus aponta que 14 espécies brasileiras invadiram ecossistemas de onde não eram nativas.

    É o caso do açaizeiro (Euterpe oleracea), palmeira de cujos frutos se extrai a famosa polpa que é nativa da Amazônia e foi trazida para cultivo na Mata Atlântica. Um dos projetos envolvendo o açaí visava, na verdade, salvar sua congênere: a palmeira juçara (Euterpe edulis), nativa da Mata Atlântica.

    Por produzir um palmito saboroso e de alto valor para a gastronomia, a juçara foi tão explorada que acabou se tornando uma espécie ameaçada. O motivo é que o palmito é justamente a parte da planta em que se formam as novas folhas e, caso seja retirado, a palmeira morre.

    Alguns pesquisadores tentaram, então, criar uma alternativa viável para a exploração da palmeira, hibridizando-a propositalmente com seu congênere amazônico que, diferentemente da juçara, entouceira, ou seja, um mesmo indivíduo gera vários caules. Assim, seria possível retirar os palmitos sacrificando apenas alguns desses caules sem matar totalmente a planta.

    O problema é que algumas dessas experiências acabaram saindo do controle. Em Sete Barras (SP), por exemplo, o açaizeiro passou a se espalhar pela mata nativa do Parque Estadual Carlos Botelho.

    O Plano de Manejo do parque considerou-a uma “espécie-problema” por sua capacidade de dispersão e pela possiblidade de hibridização natural com a juçara, o que pode causar “problemas genéticos” na população da palmeira nativa.

    Para a fundadora do Instituto Hórus, Silvia Ziller, seria importante ter um controle sobre essas espécies que têm potencial invasor, impondo, por exemplo, restrições ao seu comércio.

    “As plantas ornamentais, de uso comum, tinham que ser banidas, na medida em que estejam nas listas de plantas invasoras. Então as floriculturas teriam que ser fiscalizadas no sentido de não produzir e não vender mais essas plantas, que a gente sabe que são plantas-problema”, argumentou.

    Plantas têm uma dispersão mais fácil do que a fauna, uma vez que sementes e esporos de são de difícil contenção. No entanto, segundo Ziller, sua eliminação acaba sendo mais fácil porque, diferentemente dos animais, as plantas ficam paradas. (Agência Brasil)

    5 DE ABRIL DE 2023



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