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    Presença de bactéria no solo torna flores mais atrativas para polinizadores

    Uma bactéria que vive no solo e é conhecida por fixar nitrogênio quando associada às raízes de algumas plantas influencia de forma decisiva a capacidade de reprodução de uma espécie nativa de leguminosa chamada chamaecrista (Chamaecrista latistipula).



    Fêmeas de mamangava visitando uma flor de chamaecrista no campo. Inseto vibra as partes internas da flor para extrair os grãos de pólen ricos em proteínas, que são levados para suas larvas no ninho. Foto: Anselmo Nogueira


    Isso porque a presença do microrganismo no solo aumenta a atratividade das flores para os polinizadores.

    Essa relação entre microrganismos, plantas e animais é conhecida como mutualismo. Os mutualismos são interações entre indivíduos de diferentes espécies em que todas as partes saem ganhando, obtendo nutrientes ou se reproduzindo com a ajuda um do outro.

    É o que acontece com a chamaecrista, uma leguminosa nativa do Brasil que vive em solos naturalmente pobres em nutrientes e que depende de um tipo específico de polinizador para poder se reproduzir.

    “Um dos mutualismos importantes nessa espécie de planta é com as bactérias fixadoras de nitrogênio na raiz, que aumentam a disponibilidade desse nutriente para as plantas em troca de açúcares, que servem como alimento para os microrganismos”, conta Anselmo Nogueira, professor do Centro de Ciências Naturais e Humanas da Universidade Federal do ABC (CCNH-UFABC), em São Bernardo do Campo.

    “Há outro mutualismo entre essas plantas e um tipo específico de polinizador. O pólen da chamaecrista fica encapsulado numa parte das flores e só é liberado por vibração, quando a flor é chacoalhada principalmente por fêmeas de algumas espécies de mamangava do gênero Bombus”, completa.

    Experimentos realizados no Laboratório de Interações Planta-Animal, coordenado por Nogueira, mostraram que a presença dessas bactérias principalmente em solos pobres em nutrientes é fundamental para que as flores sejam atrativas para as mamangavas.

    “Observamos ainda um efeito drástico, que não esperávamos. Como a associação das plantas com as bactérias é muito custosa para a planta, supomos que, num solo rico em nitrogênio, as plantas simplesmente aproveitariam o nutriente diretamente do solo. Nos nossos experimentos, porém, solos ricos em nutrientes não produziram plantas saudáveis, com flores atrativas”, explica Caroline Souza, primeira autora do estudo.

    Para chegar aos resultados, os pesquisadores acompanharam o crescimento de 60 pés de chamaecrista, desde a germinação das sementes, por 16 meses. As plantas foram cultivadas em duas condições de solo.

    Metade em uma mistura composta de 90% de areia e 10% de terra vegetal, com uma baixa concentração de nutrientes, especialmente nitrogênio.

    A outra metade foi cultivada em solo rico em matéria orgânica e suplementado com nitrato de potássio, que libera nitrogênio no solo. A acidez dos dois solos foi monitorada por seis meses, para garantir que ambos estivessem neutros e não influenciassem a relação entre raízes e bactérias.

    Antes das sementes serem plantadas, porém, foram esterilizadas com álcool, água sanitária e peróxido de hidrogênio, a fim de eliminar qualquer bactéria que pudesse influenciar os resultados.

    Logo depois, foram lavadas com água destilada. Com o mesmo objetivo, o solo passou por esterilização em uma autoclave, em que os microrganismos são eliminados por altas temperaturas.

    Os dois tipos de solo foram então subdivididos em quatro tratamentos.

    Em metade dos potes com solo arenoso e pouco nitrogênio e em metade das plantas cultivadas em solo rico em matéria orgânica e nitrogênio foi acrescentada uma solução rica em rizóbio, um tipo de bactéria conhecido pela capacidade de fixar nitrogênio nas raízes.

    Os demais potes permaneceram sem as bactérias. Os microrganismos aplicados foram isolados diretamente de nódulos das raízes da mesma espécie de chamaecrista obtidas em populações naturais.

    Nos solos arenosos e pobres em nitrogênio, em que as bactérias não foram adicionadas, as plantas cresceram muito pouco, com folhas sempre amareladas evidenciando carência de nitrogênio. As plantas que obtiveram melhor desenvolvimento foram as cultivadas em solo arenoso e com presença de rizóbio.

    “Nos solos arenosos pobres em nitrogênio, mas com a presença das bactérias fixadoras de nitrogênio, as plantas eram quase duas vezes mais altas e três vezes maiores do que as cultivadas em solo com matéria orgânica, rico tanto em bactérias quanto em nitrogênio. Por outro lado, plantas em solos pobres em rizóbio, tanto no solo arenoso quanto no rico em matéria orgânica, tiveram alturas relativamente mais baixas e eram menores no geral do que as que tinham rizóbio”, relata Nogueira.

    Além disso, as flores foram analisadas com um espectrofotômetro de superfície, instrumento que mede como a luz é refletida. “A partir dessas medidas de reflectância nas flores, testamos se os contrastes de cor perceptíveis às abelhas foram alterados entre os diferentes tratamentos de solo e bactérias”, relata Souza.

    A maior parte dos componentes das flores não teve padrões diferentes entre os tratamentos.

    No entanto, as anteras das flores que cresceram em solo arenoso, pobre em nitrogênio e rico em rizóbio, exibiram um padrão considerado mais atrativo para as mamangavas, que enxergam em um espectro de luz diferente do nosso.

    “As anteras são justamente onde fica o pólen das flores, que só pode ser acessado por insetos que conseguem vibrá-las, algo que espécies exóticas como as abelhas europeias (Apis mellifera) não conseguem”, afirma Souza.

    Uma indicação de que houve uma interação entre rizóbio e planta é a quantidade de nódulos nas raízes.

    Os nódulos são estruturas formadas nas raízes quando as bactérias infectam as plantas por essa via. É neles que se dá a simbiose mutualista entre plantas e bactérias e onde as bactérias fixam o nitrogênio atmosférico, produzindo aminoácidos essenciais para as plantas. Em contrapartida, as plantas fornecem açúcares para as bactérias, que se proliferam dentro dos nódulos.

    De todos os tratamentos, o que mais resultou em nódulos foi o dos solos arenosos, pobres em nitrogênio, mas com presença de rizóbio. (André Julião/Agência FAPESP)

    6 DE JULHO DE 2024



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